Pesquisadores da Universidade da Califórnia em Irvine (UC Irvine) anunciaram a observação experimental de um novo estado da matéria quântica — um tipo exótico de “líquido excitônico triplo de spin” — finalmente confirmado em laboratório após décadas de predição teórica. A descoberta, publicada na Physical Review Letters, representa o primeiro registro de um emparelhamento espontâneo de elétrons e lacunas (“holes”) girando na mesma direção, em um material chamado pentatellureto de háfnio (HfTe₅) sob campos magnéticos hiperintensos, de até 70 Teslas.
A transição quântica se manifestou após a brusca queda na condutividade elétrica do material quando submetido ao campo magnético extremo. Nesse momento, os elétrons e lacunas formaram um fluido exótico que, segundo o professor Luis A. Jauregui, autor principal do estudo, “se comporta como uma substância que teria luz de alta frequência se pudéssemos segurá-la”.
O aspecto mais notável desse novo estado é sua completa imune à radiação ionizante — algo inimaginável em semicondutores convencionais. Essa característica torna o material promissor como base para sistemas computacionais e sensores destinados ao espaço profundo, onde a radiação cósmica danifica rapidamente a eletrônica tradicional.
Segundo Jauregui, essa descoberta pode inaugurar uma “era de computadores autocarrégáveis” e eletrônica baseada em spin, eliminando a necessidade de energia elétrica convencional e reduzindo a vulnerabilidade às condições extremas durante viagens interplanetárias, como missões tripuladas a Marte já previstas por empresas como a SpaceX.
O material desenvolvedor — sintetizado no laboratório da UC Irvine por Jinyu Liu com apoio de estudantes — foi testado em colaboração com o National High Magnetic Field Laboratory e instalações especiais do Laboratório Nacional de Los Alamos, envolvendo modelagem teórica e instrumentação avançada para detectar o estado quântico.
As implicações são enormes: dispositivos spintrônicos alimentados por energia térmica ou luminescente do próprio estado excitônico podem funcionar sem baterias, oferecer eficiência energética incomparável e operar durante anos sem manutenção no espaço. Além disso, a resistência total à radiação abre caminho para eletrônica confiável em satélites, sondas e habitats espaciais.
A descoberta consolida décadas de hipóteses sobre isolantes excitônicos — especialmente o tipo spin-triplet — que até então permaneciam fora do alcance experimental. Trata-se de um marco histórico ao conectar teoria teórica com tecnologias aplicáveis em spintrônica, computação quântica e exploração espacial.
Os autores reconhecem que ainda há desafios técnicos a serem superados: o controle do efeito em campos mais baixos, estabilidade das fases e integração em dispositivos práticos. Contudo, eles afirmam que esse resultado pode ser o pontapé inicial para transformar o modo como projetamos eletrônica de bordo, instrumentos científicos e sistemas autossuficientes em ambientes extremos.
Este novo estado quântico abre uma porta para tecnologias autossustentáveis e robustas que podem redefinir a exploração espacial no século 21: computadores que não precisam ser carregados, sensores resistentes à radiação e módulos eletrônicos com durabilidade inédita fora da Terra.