Em uma descoberta que parece saída da ficção científica, físicos do Instituto de Física e Tecnologia de Moscou (MIPT), em parceria com pesquisadores dos Estados Unidos e da Suíça, anunciaram um avanço notável no campo da mecânica quântica: um sistema que, em condições altamente controladas, consegue reverter o estado temporal de uma partícula subatômica por uma fração de segundo. O estudo foi publicado na Scientific Reports, revista do grupo Nature, e reacende debates sobre as implicações da reversibilidade do tempo em sistemas físicos.
Desfazendo o tempo quântico
O experimento envolveu o uso de um computador quântico baseado em qubits — as menores unidades de informação quântica — submetidos a um algoritmo especialmente desenvolvido para “retroceder” o estado do sistema. Em vez de simplesmente evoluir o sistema adiante no tempo, como ocorre em todos os experimentos tradicionais, os cientistas reverteram a direção da equação de Schrödinger, que rege a dinâmica dos sistemas quânticos.
De forma simplificada, os físicos conseguiram retornar um sistema quântico a um estado anterior com até 85% de precisão em um modelo com dois qubits, embora a taxa caia à medida que a complexidade aumenta. O resultado não implica necessariamente viagem no tempo, mas representa um tipo de “desfazer” computacional que pode, no futuro, permitir a correção de erros sem perda de informação.
“Seta do tempo” desafiada
Um dos pontos mais interessantes do estudo é sua relação com o conceito da “seta do tempo”. A física clássica descreve as leis fundamentais como simétricas no tempo — ou seja, elas funcionam da mesma maneira se o tempo for revertido. No entanto, fenômenos como entropia e decoerência tornam os eventos macroscópicos irreversíveis.
Ao simular a reversão do tempo em sistemas quânticos controlados, os pesquisadores oferecem uma nova perspectiva sobre a reversibilidade de processos físicos em escalas microscópicas — algo que, até então, era considerado puramente teórico.
Aplicações potenciais
A pesquisa pode ter desdobramentos importantes no desenvolvimento de computadores quânticos mais eficientes e robustos. Um dos maiores desafios da computação quântica é o problema dos erros causados por interferência externa e instabilidade nos qubits. A capacidade de reverter estados quânticos pode permitir, por exemplo, a correção desses erros sem destruir a informação armazenada, aumentando a confiabilidade e a durabilidade desses sistemas.
Além disso, o estudo abre caminho para discussões mais profundas sobre a natureza do tempo. Como explica o físico Valerii Vinokur, do Argonne National Laboratory (EUA), coautor do trabalho: “A reversão do tempo era, até agora, algo abstrato em física. Nosso experimento mostra que, em certos contextos e sob determinadas condições, é possível realizar algo análogo em sistemas reais.”
Reações da comunidade científica
Embora o estudo tenha sido recebido com entusiasmo, especialistas alertam que a reversão temporal observada é altamente limitada em escopo e não representa uma manipulação do tempo em escalas humanas ou cósmicas. O professor David Deutsch, da Universidade de Oxford e um dos fundadores da teoria da computação quântica, afirmou em entrevista à BBC Science Focus que o resultado é “tecnicamente notável”, mas que ainda há muito a ser entendido sobre como o tempo emerge da física fundamental.
Limitações e desafios futuros
A maior limitação do experimento é que a reversão do tempo só ocorre sob condições extremamente controladas e artificiais, e apenas por breves momentos. Além disso, o aumento no número de qubits reduz significativamente a eficácia da reversão, indicando que escalabilidade será um desafio técnico complexo.
Os autores do estudo estão atualmente trabalhando em algoritmos mais sofisticados para simular retrocessos mais longos e eficazes. Há também interesse em explorar as implicações da reversão quântica na termodinâmica e na cosmologia — incluindo discussões especulativas sobre a origem do universo e o papel do tempo na evolução do cosmos.