Pesquisador Indranil Banik, da Universidade de Portsmouth, apresentou uma hipótese ousada segundo a qual a Via Láctea pode estar localizada dentro de um vazio cósmico de escala extraordinária — aproximadamente 1 bilhão de anos-luz de raio —, o que explicaria, de forma natural, a discrepância entre medições de expansão local e remota do universo, a chamada Tensão de Hubble. A análise, apresentada no Encontro Nacional de Astronomia 2025, reúne dados de oscilações acústicas bariônicas (BAO) observados nas últimas duas décadas, contando que a densidade local seria cerca de 20% menor que a média cósmica.
De acordo com a proposta, esse subdensidade — conhecida como supervazio KBC — gera um efeito gravitacional: matéria sobressalente nas regiões externas atrai hidrogênio e galáxias, fazendo com que objetos próximos se afastem de nós mais rapidamente, o que produz a impressão de expansão local acelerada. A comparação entre modelos homogêneos (ΛCDM) e modelos com vazio, aplicados a 41 observações de BAO, mostra que aqueles com vazio oferecem um ajuste significativamente melhor aos dados, reduzindo a tensão de ≈3 σ para apenas ≈1 σ.
“Uma solução local, como um vazio gigante, é uma explicação promissora para a Hubble tension”, afirmou Banik, ressaltando que tais medições se concentram em nossas regiões cósmicas próximas e não indicam discrepâncias quando aplicadas ao universo primitivo, como observado no fundo cósmico de micro-ondas.
Embora a existência de um vazio dessa magnitude desafie o modelo padrão ΛCDM — que prevê uniformidade em escalas tão grandes —, evidências vêm se acumulando: contagens de galáxias em infravermelho e outros censos espaciais coincidem com a estimativa de densidade ~20% abaixo da média. Além disso, a hipótese também parece explicar o chamado “bulk flow”, correntes de galáxias com velocidades anômalas em até 250 Mpc, outro problema para o ΛCDM.
A alternativa de Banik também dialoga com teorias de gravidade modificada, como a dinâmica Newtoniana modificada (MOND), que poderia complementar o modelo vazio para explicar o crescimento temporal das estruturas no universo. No entanto, a hipótese carece de confirmação com métodos independentes, como cronômetros cósmicos — galáxias cujos espectros revelam a idade estelar —, que permitiriam mapear a expansão a diferentes distâncias.
Se confirmada, a ideia de que vivemos num vazio cósmico gigante teria implicações profundas: não apenas redefiniria a interpretação da taxa de expansão local, mas também questionaria a homogeneidade assumida em escalas cosmológicas pelo ΛCDM. Além disso, abriria caminho para repensar a gravidade em grandes escalas, possivelmente indicando a necessidade de ajustes nas leis de Einstein quando aplicadas ao universo em grande escala.
A comunidade científica já delineia os próximos passos: coleta de mais dados de BAO em larga escala, aplicação de cronômetros cósmicos em múltiplas zonas, e análise de modelos numéricos que incorporem vazios localizados. Assim, será possível confirmar se nosso endereço galáctico é, de fato, excepcional — e reconhecer que, talvez, os mistérios da expansão do universo estejam mais próximos do que imaginamos.