A Agência Espacial Europeia (ESA) acaba de cruzar um marco extraordinário em observação solar, ao realizar os primeiros eclipses solares artificiais em órbita terrestre com sua missão Proba‑3. Constituída por dois satélites gêmeos — o Occulter e o Coronógrafo — voando em refinada formação a apenas 150 metros um do outro, a missão proporcionou eclipses sob demanda que duraram até cinco horas, um feito sem precedentes que abre novas fronteiras para o estudo da coroa solar.
Lançados em dezembro de 2024 a bordo de um foguete PSLV‑XL da Índia, os satélites levaram meses para atingir uma órbita elíptica com perigeu de aproximadamente 600 km e apogeu de cerca de 60 000 km, com período orbital de 19,7 horas. Desde março de 2025, em sua fase de comissionamento, a formação vem se alinhando para simular eclipses. O Eso obteve um total de dez eventos até agora, sendo o maior deles com cinco horas de duração e a expectativa de alcançar eclipses de até seis horas cada, duas vezes por semana, ao longo de dois anos — somando mais de mil horas de observação contínua.
A precisão requerida é quase inacreditável: os satélites mantêm posição relativa com tolerância de apenas um milímetro — menos que a espessura de uma unha — utilizando navegação por GPS, rastreadores estelares, lasers e conexões por rádio, tudo de forma autônoma. O Coronógrafo ASPIICS, a bordo do satélite seguidor, é o responsável por coletar imagens nítidas da coroa, superando limitações do coronógrafo tradicional, cujo disco bloqueador fica muito próximo do telescópio.
Andrei Zhukov, líder científico do projeto no Observatório Real da Bélgica, celebrou os resultados iniciais: “Quase não acreditamos nos nossos olhos. Isso foi na primeira tentativa e funcionou. Foi incrível”. Ele ainda ressaltou a qualidade surpreendente das imagens, que capturam a coroa solar — região milhões de graus mais quente que a superfície solar — sem precisar de pós-processamento complexo.
Além de protagonizar um avanço tecnológico crucial no voo orbital de precisão, a missão Proba‑3 traz ganhos científicos significativos. A coroa solar é a origem das ejeções de massa coronal (CMEs), que podem provocar tempestades geomagnéticas capazes de impactar satélites, comunicações e redes de energia na Terra. Com até seis horas de observação por eclipse, pesquisadores poderão analisar suas dinâmicas em detalhes inéditos, incluindo variações ao longo de cada órbita.
O coronógrafo externo também permitirá medir a irradiância solar total, fator essencial para modelos climáticos, como destacou Wolfgang Finsterle, do Observatório Meteorológico de Davos: “Mesmo as menores variações na irradiância afetam substancialmente o clima da Terra”.
Josef Aschbacher, diretor-geral da ESA, sublinhou o impacto estratégico da missão: “É emocionante ver essas imagens validarem nossas tecnologias na primeira missão de voo de formação precisa do mundo”, comentou.
Com duração prevista de dois anos, Proba‑3 não apenas fornecerá um pacote riquíssimo de dados para fenômênios solares, mas também testará tecnologias com aplicações futuras — como constelações científicas, formação de mega-instrumentos no espaço, missões de sondas autônomas e remoção de lixo orbital.
Com uma combinação rara de inovação tecnológica e pesquisa científica de ponta, os eclipses artificiais da ESA representam um passo decisivo na exploração do Sol e fortalecem o protagonismo da Europa em astronomia e meteorologia espacial. A missão Proba‑3 inaugura uma nova era para o monitoramento da corona solar, agora livre das limitações impostas pela raridade dos eclipses naturais — um verdadeiro laboratório orbital para desvendar os segredos do nosso astro.