A névoa azul que envolve Plutão, capturada pelo Telescópio Espacial James Webb (JWST), não é apenas um fenômeno visual intrigante — ela desempenha um papel crucial no resfriamento da atmosfera do planeta-anão, revelam novos dados publicados em Nature Astronomy. Observações feitas entre 2022 e 2023 com o instrumento MIRI (Mid-Infrared Instrument), capazes de separar os sinais térmicos de Plutão e sua lua Caronte, confirmaram que partículas de metano e nitrogênio absorvem luz solar durante o dia e a emitem como radiação infravermelha à noite, estabelecendo um sistema climático sem precedentes no Sistema Solar.
Essa teoria foi originalmente proposta em 2017 pelo pesquisador Xi Zhang, da UC Santa Cruz, com base em dados da sonda New Horizons, que mostraram uma atmosfera invisível ainda mais fria que o previsto — cerca de –203 °C em sua camada superior, aproximadamente 30 °C abaixo das estimativas. A ideia, considerada “maluca”, sugeria que a névoa agiria como reguladora térmica. A nova análise do JWST confirmou essa previsão. Como afirmou Zhang, “Foi uma ideia maluca… nos sentimos muito sortudos e animados”.
O estudo foi conduzido por uma equipe liderada por Tanguy Bertrand, do Observatório de Paris. “É algo único no Sistema Solar. Um novo tipo de clima”, declarou ao Live Science. O método envolveu a análise precisa dos espectros infravermelhos de Plutão entre 4,9 e 27 μm, captados pelo MIRI, que identificaram emissões específicas atribuídas à névoa — fenômeno que instrumentos anteriores não conseguiam isolar por causa de Caronte.
Esse equilíbrio térmico tem impactos notáveis: além de resfriar a mesoesfera, a névoa facilita o escape de metano e outros compostos orgânicos para o espaço, parte dos quais chega a congelar nas regiões polares de Caronte. A dinâmica única na troca atmosférica entre Plutão e sua lua não é observada em nenhum outro sistema planetário.
Além de desvendar a singularidade climática de Plutão, a descoberta oferece pistas sobre outros corpos com neblinas densas — como Titã (Saturno) e Tritão (Netuno) —, sugerindo que fenômenos similares podem existir ali. Há ainda paralelos com a Terra primitiva: antes da formação do oxigênio, nosso planeta poderia apresentar uma atmosfera dominada por nitrogênio e hidrocarbonetos, com neblinas semelhantes às observadas em Plutão. “Estudá-la pode oferecer insights sobre as condições que tornaram a Terra habitável”, afirmou Zhang.
Essa combinação de teoria comprovada, tecnologia de ponta e implicações evolutivas torna o achado um marco para a astronomia planetária. O sistema climático de Plutão corrobora hipóteses sobre interações complexas entre neblina, calor e escape atmosférico, e abre novas perspectivas para modelagens climáticas de mundos distantes.
Daqui para frente, o JWST continuará a examinar outros pontos do espectro infravermelho e a observar Plutão em diferentes estações de sua órbita excêntrica, buscando entender como essas dinâmicas variam ao longo do tempo. Ao mesmo tempo, a comunidade científica já se prepara para estudar atmosferas nebulosas em luas e exoplanetas, potencialmente redefinindo nossa compreensão dos climas planetários.
Com essa descoberta, Plutão deixa de ser apenas um objeto gelado e distante: revela-se um laboratório natural para estudar processos climáticos exóticos — e talvez, colocar novas peças na história da habitabilidade planetária.